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terça-feira, 1 de dezembro de 2015

GENOCÍDIO NEGRO

Terrorismo policial de Estado
contra a população trabalhadora negra

Mais uma chacina de negros, trabalhadores e filhos de trabalhadores. 5 jovens negros que comemoravam o primeiro salário que um deles havia recebido foram metralhados covardemente, sem chance sequer de se identificarem, pela Polícia Militar do Rio de Janeiro. Não importava quem eram, eram negros e pobres. Isso bastava para que fossem condenados ao fuzilamento sumário. Em seguida, a polícia não deixou que as pessoas que se encontravam no local prestassem socorro, e fabricaram, como de hábito, os famosos “autos de resistência” para justificar seus crimes. “‘Eles alteraram a cena do crime, pegaram a chave do carro da mão do motorista morto, colocaram lá dentro uma pistola para dizer que aqueles jovens eram bandidos’, disse um morador”. Em seguida, também como de costume, diante da indignação nacional, principalmente da população trabalhadora, o Estado capitalista mandante responsabiliza os executores pelo crime.

Poucos dias antes, ganhou publicidade o massacre de 11 negros pobres por outro grupo de extermínio policial na capital do Ceará. Mas, a maioria dos casos cotidianos, que ceifa anualmente vida de milhares de jovens, não ganha qualquer popularidade e, pelo contrário, “torna-se natural”, e é “justificado” pela mídia e pela classe média reacionária como uma reação contra a “violência urbana”, e o genocídio se amplia com a redução da maioridade penal, como uma instituição tácita da pena de morte sobretudo para esse setor da população explorada e oprimida. As vítimas são as mesmas “de sempre”. Os assassinos, também: a polícia, o Estado terrorista capitalista. A juventude rebela-se como pode, rolezinhos, ocupações de escola, protestos de rua, ... e aprende durante o combate. O aparato repressivo policial não pode ser reformado, "desmilitarizado", precisa ser extinto para que exista paz nos bairros proletários, para que exista futuro para a juventude negra e trabalhadora.

Abaixo reproduzimos um artigo do camarada Edimilson Rosário, publicado no Folha do Trabalhador 25, acerca do genocídio negro.

O Estado atira, mas
quem legitima é a sociedade

Edimilson Rosário

De acordo com o Mapa da Violência, o Brasil tem mais de 56 mil assassinatos por ano. 77% das pessoas assassinadas são negras e 90% são homens. Não se pode dizer que essas mortes ocorram por algum comportamento das vítimas, pois o principal responsável por essa violência são as forças do Estado que nos locais de moradia invadem atirando para todos os lados e alvejando aqueles que eles consideram "criminosos em potencial". Por esse motivo também não se pode dizer que trata-se de uma "guerra aos pobres", como dizem alguns setores da esquerda, pois os escolhidos como alvo não são pobres em geral, são os negros. Essa é uma política racial de Estado. Um verdadeiro genocídio.

Outra vertente dessa política de extermínio é o encarceramento em massa. O Brasil possui aproximadamente 700.000 pessoas encarceradas, a terceira maior população carcerária do planeta. Quase 70% das pessoas em condição de encarramento são negros, 60% homens. A maioria por delitos de menor potencial ou sem sequer sem terem alguma condenação ou ainda por uma suposta "guerra às drogas" que, na verdade, tem o objetivo de legitimar uma política de fazer desaparecer a população negra pelo uso da violência .

Encarceraento em massa além do puro e simples extermínio são faces da política de genocídio racial que ocorre no Brasil de forma naturalizada. E essa naturalização ocorre através do incentivo à cultura de violência e culpabilização cotidiana contra negros de forma a legitimar as ações racistas do Estado. Essa cultura permeia toda a sociedade e contamina até mesmo os movimentos sociais.

A persistência das ideias lombrosianas

Lombroso foi um médico e criminologista italiano que defendia o desaparecimento dos negros. No no final do século XIX ele formulou a tese de que os criminosos teriam uma propensão genética para a prática da violência. O perfil do criminoso nato descrito por ele era de características negras. Apesar de essa tese ter se mostrado sem quaquer fundamento, acabou criando raízes tão profundas na cultura que produz efeitos até os dias de hoje através da prática policial e através do medo negro disseminado na sociedade.

No dia a dia da sociedade o negro é visto como um elemento perigoso que deva ser afastado. Ao ver um homem negro pessoas atravessam a rua, muitas vezes para perto de alguém branco, e reclamam da falta de policiamento; Empresas raramente contratam negros para o desempenho de determinadas funções que requeiram lidar com o público; jovens negros na rua são vistos como potenciais criminosos... toda essa visão é estimulada pela pelo Estado e pela grande imprensa. Recentemente a Polícia Militar de São Paulo divulgou uma cartilha orientando as pessoas a tomarem cuidado com assaltos e o perfil do assaltante típico, conforme descrito nessa cartilha, era o homem negro. Na mesma época uma empresa de táxi do Rio de Janeiro lançou uma peça de publicidade tentando convencer principalmente as mulheres de que andar de táxi seria uma maneira segura de se precaver contra estupros e assaltos. O perfil do assaltante estuprador em potencial era o homem negro.

Nos movimentos sociais, que deveriam ter uma prática progressista, o lombrosianismo se observa através das manifestações do punitivismo. Em cerca de 40 casos acompanhados em todo o Brasil de acusações morais e expulsão dos fóruns do movimento, 32 dos acusados eram homens negros, mesmo estes sendo minoria nos espaços do movimento. Nos casos acompanhados as acusações eram todas graves, mas sem qualquer indício de serem verdadeiras. Ainda assim foram suficientes para legitimar punições sumárias. Essa tendência de até mesmo os movimentos sociais a todo momento culpabilizarem e condenarem os negros sem sequer qualquer chance de defesa demonstra o quanto as idéias do lombroso e o mito da raça perigosa, ou até mesmo o puro e simples desejo de ver negros distantes e sem qualquer condição de assumir qualquer protagonismo, criou profundas raízes na esquerda pequeno burguesa.

Essa cultura geral que permeia a sociedade é o que dá legitimidade para que o Estado pratique a política de genocídio racial. Portanto, a reivindicação pelo fim do genocídio deve ser dirigida contra o Estado, inclusive através da disseminação de uma cultura de auto defesa negra, mas deve ser também cobrada de cada pessoa que pratique ações legitimadoras do genocídio na sociedade, principalmente nos fóruns de esquerda.

A responsabilidade da esquerda pequeno burguesa

Nesse aspecto, a esquerda pequeno burguesa possui uma responsabilidade extra pois tem sucumbido completamente às reivindicação pelo fortalecimento do aparato genocida.

O pretexto sustentado por essa esquerda de que existem inúmeras "opressões" e todas elas iguais ao racismo, ou seja, sem hierarquia entre si, tem duas consequêncais criminosas. A primeira delas é fazer renascer o mito da democracia racial que o movimento negro desmascarou a duras penas. De acordo com esse mito, no Brasil não haveria diferença de raças e todos seriam iguais. Essa ideia está a serviço de esconder a existência do racismo. A falácia da existência de infinitas opressões sem qualquer hierarquia entre si acaba igualmente jogando o racismo para de baixo do tapete na medida em que iguala o negro a um infinito número de setores que se apresentam como igualmente oprimidos. De acordo com essa tese qualquer pessoa poderia se enquadrar em alguma categoria de "oprimido" sendo que todos teriam poder para ao mesmo tempo praticar ou sofrer opressão. Para sustentar essa tese desvirtuam o conceito de opressão igualando-a a a qualquer preconceito. Assim, o negro teria poder na sociedade de oprimir a mulher, o gay, o portador de alguma limitação física, o que tem cabelo verde, o que tem dificuldade de fala ... Ocorre, porém, que racismo é algo muito pior do que qualquer preconceito. Apenas para exemplificar, racismo leva e está levando ao extermínio. Não existe, porém, extermínio de nenhum outro setor social que não o negro, por mais que esses outros segmentos possam sofrer algum tipo de violência diferenciada. Na verdade quem é exterminado e é maioria em todos os indicadores de desvantagem social é apenas o negro. É uma realidade que joga por terra o conceito de inexistência de hierarquia de opressões que tem os mesmos efeitos que o mito da democracia racial.

A segunda consequência dessa falácia que ganhou força na esquerda pequeno burguesa está diretamente relacionada ao genocídio.

A tese de que existem múltiplas opressões, tem sido usada para legitimar que o Estado combata essas opressões usando o seu aparato genocida. Por isso, quase todos os movimentos dessa esquerda, dizendo querer combater a sua "opressão" particular, revindicam a criação de mais leis criminalizadoras e o fortalecimento do aparato policial. Ou seja, reivindicam mais armas para a polícia e mais leis penais que serão usadas única e exclusivamente para que existam mais e mais desculpas para se encarcerar e matar injustamente aqueles que sofrem o genocídio,os negros. Tudo isso é elemento de legitimação do genocídio e é o que acontece invariavelmente quando setores brancos começam a tentar se passar por tão oprimidos quanto os negros.

A maior violência que existe hoje na sociedade é o genocído negro. Maior em dados estatísticos e maior também por ser a morte uma violência incomparável a qualquer outro tipo. Porém o genocídio negro também é a maior violência porque para que ele seja legitimado, impõe uma cultura que leva a sociedade a praticar de forma generalizada diversas outras formas de violência contra o negro. Tudo isso invisibilizado e tratado como algo tão normal que a sociedade tem dificuldades até mesmo de enxergar que ocorra um genocídio racial no Brasil, ainda que o número de negros vítimados seja maior do que o número de mortos na maioria das guerras que ocorrem pelo mundo. Se o racismo da sociedade lhe impede de enxergar o genocídio, muito mais não será capaz de ver outras formas de violência diária contra negros, com a violência psicológica, o terror da culpabilização e acusação constante.

Se essa violência toda ocorre até mesmo dentro dos movimentos que discutem a sociedade de forma crítica... Imagine o que ocorre nos outros espaços.